E se aprendêssemos como crianças?

 

Tenho uma filha de 2 anos e meio. É fascinante para mim, uma apaixonada por aprendizagem, acompanhar o desenvolvimento dela dia após dia. Acho lindo quando ela aprende a dizer “para mim”, em vez de “para a Marina”, ou sua descoberta das normas sociais, respondendo “oi, fulano”, “bom dia” e “tchau”. O processo de aprendizagem dela é rápido e natural. Sua curiosidade é, muitas vezes, mais forte do que a fome ou o sono. Descobrir como o pé molhado forma pegadas no chão pode ser mais interessante do que almoçar. E entender como abrir uma caixa nova pode ser prioridade, em vez de deitar e dormir. Aí, me pergunto: como e por que perdemos esses ímpetos, tão bonitos?

A neurociência tem suas explicações. É na infância que o cérebro está se formando. Por isso, nesta curiosidade há questões de evolução e sobrevivência da espécie. Para nos tornarmos quem somos, precisamos passar pelo processo de aprender a sermos humanos.

Como diz uma neurocientista, “é preciso mais de um cérebro para formar uma mente”. Somos uma espécie que depende do afeto e da interação com outros humanos para nos tornarmos quem somos. Levamos muito tempo para nos tornar independentes. Por isso, aprender é tão fundamental para o nosso desenvolvimento nos primeiros anos.

Já na fase adulta, a prioridade é outra. É sobrevivermos. É sermos socialmente aceitos. É termos nosso ganha-pão.

Pode haver um aspecto biológico-evolutivo nessa mudança de postura da infância para a fase adulta – nessa redução da curiosidade, nessa ampliação do medo de errar para ser aceito, nessa tendência de buscar respostas prontas.

Há, porém, quem culpe a escola, que pune o erro com rigor, que inibe a criatividade, ao impor padrões rígidos de certo e errado, que nos faz querer ser aceitos no grupo, muitas vezes abrindo mão de nossas perguntas e da nossa forma de pensar. Pensando bem, vários aspectos da educação, inclusive na família, têm essas características.

Eu diria que, na responsabilidade por essa transformação na fase adulta, há uma mistura dos dois: evolução e educação.

E, talvez, para manter nossa energia nas perguntas, na curiosidade, nas descobertas, precisamos de uma educação e um ambiente que nos estimule a ser mais como crianças: na abertura para o novo e para o mundo, sem medo de errar; na alegria de descobrir algo que não sabíamos; no desejo de conhecer mais. Eu costumo contar uma história da minha filha. Quando tinha pouco mais de 1 ano, ela brincava com uma espécie de lego, mas mais fácil, para crianças pequenas, de outra marca. Quando ela já estava dominando este brinquedo, comprei um lego, daqueles maiores, também para a idade dela. Num determinado momento, ela tentou encaixar os dois brinquedos de marcas diferentes. Meu primeiro impulso foi de mostrar para ela que não era possível, porque, afinal, eram encaixes diferentes. Mas segurei meu impulso. Era melhor que ela descobrisse isso sozinha. Qual não foi minha surpresa quando a pequena simplesmente conseguiu? Ela conseguiu encaixar as duas peças, mesmo sendo de marcas diferentes. Aquilo era possível, mas eu, com minha cabeça de adulto, presumi que não, sem nem mesmo experimentar.

E é disso que estou falando: curiosidade e experimentação.

Para lidarmos com o mundo contemporâneo – de grandes transformações, que exige agilidade, inovação e até disrupção, num cenário de muita incerteza – essas características da infância são mais relevantes do que nunca.

Precisamos estar cada vez mais curiosos e prontos para experimentar, mesmo correndo o risco de errar. É assumindo esse risco que podemos criar algo novo.

No fundo, isso significa que precisamos estar abertos a aprender sempre. Aprender não é acumular conhecimento. Aprender tem a ver com reflexão e ação. Aprender tem a ver com como usar conhecimento para questionar e experimentar.

Pensar em como resgatar a curiosidade, a alegria e a experimentação da infância nas organizações: aí está um grande e maravilhoso desafio!

(Um parêntese sobre o erro: não estou falando de qualquer erro, mas daquele erro honesto, em que arriscamos tentar fazer algo diferente e melhor. É o erro do qual podemos tirar aprendizados, cujos riscos foram avaliados e aceitos previamente. Não me refiro a omissão, negligência ou imprudência.)

Por Nira Bessler, lifelong learner, especialista em aprendizagem de adultos e apaixonada pelo tema.

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