Por Nira Bessler, lifelong learner, especialista em aprendizagem de adultos e apaixonada pelo tema.
O que você precisou aprender no trabalho, durante a pandemia? Atenção: a pergunta não é “se” você aprendeu, mas sim “o quê”. Sem muito medo de errar, arrisco dizer que as mudanças trazidas pela pandemia geraram necessidades de aprendizagem para quase todo mundo.Foram transformações repentinas que nos obrigaram a aprender a usar novas tecnologias (Zoom ou Teams, por exemplo), a nos relacionar de forma diferente (gerir uma equipe ou colaborar à distância, adequar a comunicação ao digital) etc.
Tudo isso aconteceu rápido e, por incrível que pareça, com uma boa taxa de sucesso. Uma mudança em massa para o home office, que parecia improvável antes da pandemia, aconteceu de forma acelerada em pouquíssimo tempo.
Este panorama é revelador sobre a nossa capacidade de aprender. Somos mais adaptáveis do que imaginávamos. Temos mais possibilidades de nos desenvolver do que acreditávamos. Especialmente, quando temos a confiança dos líderes e das organizações para que este processo aconteça.
Mundo VUCA ou BANI?
A habilidade de aprender diante de novos cenários não é importante apenas por causa da pandemia. Ela vai continuar sendo relevante nos próximos anos. É o que nos dizem os especialistas: vivemos um mundo VUCA – Volátil, Incerto, Complexo e Ambíguo – ou BANI – Frágil, Ansioso, Não-Linear e Incompreensível -, como preferir.
Independentemente das siglas, o que importa é que as mudanças vão continuar. Então nós – como indivíduos e organizações – precisamos estar preparados para elas. Teremos que nos manter abertos a aprender coisas novas, nos adaptando às mudanças de cenário, comportamento, mentalidade e tecnologias. Em outras palavras, pessoas e empresas precisam criar uma cultura de aprendizagem baseada em princípios de autodireção, autodeterminação ou, ainda, de heutagogia.as precisam criar uma cultura de aprendizagem baseada em princípios de autodireção, autodeterminação ou, ainda, de heutagogia. Heuta o quê?Para que mudanças de comportamento e aprendizagem aconteçam de forma ágil, elas devem partir das pessoas. Afinal, como já comentei em outros artigos, toda aprendizagem é ativa e depende de cada um. Organizações podem – e devem – apoiar as pessoas, mas, no fim das contas, a aprendizagem só acontece se os indivíduos se mobilizarem.
E o que a heutagogia tem com isso?
Na heutagogia – diferentemente da andragogia – o foco não é o ensino por um professor ou facilitador. A heutagogia envolve a criação de ambientes de aprendizagem que facilitem o desenvolvimento não apenas de conhecimentos e habilidades, mas também da própria capacidade de aprender.
O aprendiz, na heutagogia, identifica suas próprias necessidades de aprendizagem e resultados esperados. Assim, avança além do seu conhecimento, buscando competências adaptativas e sendo responsável pelo seu processo de aprendizagem.
Quando as pessoas são empoderadas para serem donas de suas jornadas de aprendizagem – com suporte das empresas para isso – os níveis de resiliência, motivação e performance aumentam. É o que mostrou uma pesquisa do relatório Back to the Future, da Emerald.
Organizações que estimulam a heutagogia têm chances 24% maiores de reter um talento e 28% maiores de responder mais rapidamente a mudanças nas condições dos negócios.
Assim, a companhia como um todo também pode aprender de forma mais fácil e eficiente.
Confiança
Nesta mistura toda, há um ingrediente fundamental: a confiança. As mudanças trazidas pela pandemia mostraram que, quando organizações permitem e confiam na nossa capacidade de aprender e nos adaptar a uma nova situação, nós respondemos.
Com todas as dificuldades, muitos de nós aprendemos a trabalhar em home office com uma rapidez impressionante. Passaremos por novas mudanças e disrupções. Mas podemos e devemos tentar tornar este processo menos traumático.
O papel das empresas é justamente criar ambientes com segurança psicológica e suporte para que isso seja possível. E também mostrar aos profissionais que, sim, eles podem confiar em sua própria capacidade de aprender.
É a combinação destas duas confianças – individual e organizacional – que gera o ambiente para o desenvolvimento da heutagogia.
O Papel da Educação Corporativa
Em organizações de ponta, a heutagogia (ou abordagens semelhantes, de autodireção) é, cada vez mais, o caminho escolhido para lidar com um ambiente que demanda inovações constantes, ao mesmo tempo em que dá mais liberdade e satisfação aos profissionais.
O mundo da Educação Corporativa não se limita mais aos treinamentos. Estamos apenas no início de um novo paradigma para a área, que tem tudo para se tornar mais estratégica do que nunca – desde que esteja aberta à inovação e a um novo jeito de pensar.